segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Não te quero perder

Segunda, 27 de Dezembro de 2004
 
 
Ainda hoje faço o meu diário e, com ele, não me esqueço o que se passou em determinado dia. Também foi assim com o Fernando Pedro. Registei os bons momentos e os maus. Não me sinto glorificada por isso. Foi um mau passo que dei e tenho que viver com a sensação de que comi e não gostei, embora, na altura, achasse que era o melhor que estava a fazer.
A minha filha saiu cedo para ir ter com as amigas e disse que só vinha jantar. ( - Mamã, o dia é teu. Faz o que quiseres com ele. Mas não me contes como foi. Já sabes que eu não gosto daquele fulano... Foram as suas palavras quando saiu. Eu respeitei e nem lhe disse que tinha vontade de ir ter com ele. Se ele me convidasse, claro.)
 
 
09h25m10s
 
 
Tocou o telefone e corri como louca a atender. Já sabia que era o Pedro.
 
 
- És tu?
- Claro. E quem querias que fosse? O Pai Natal já veio. Bom dia meu doce Amor. dormiu bem? Está bem disposta? Tenho um convite.
- Bom dia, Amor. Então qual é o convite?
- Queres vir passar o dia comigo? Vens no comboio das onze e já não vou trabalhar da parte da tarde. Que me dizes?
- Digo que sim. Estou com saudades...
- Eu também tenho muitassss saudades tuas. Não te quero perder, ouvistes? És o meu respirar. Quando não estou contigo, sufoco. Percebes?
- Percebo. Comigo também acontece o mesmo.
- Ainda bem. Mas agora tens cá a tua filha...
- Felizmente. Mas o teu lugar, é teu....
- Eu sei. E agora despacha-te que tens um comboio para apanhar. Não percas uma coisa tão grande. Hi! Hi! Hi!
- Ok! beijinho e até mais logo.
- Beijinho meu docinho. Tu iluminas o meu dia.
 
 
 
Quando nos encontrámos já passava das doze horas e fomos almoçar ao " comida a peso". Ele ia sempre à frente. Quem ficava atrás, pagava a conta. Já era hábito e eu já me havia habituado. Depois do almoço fomos para o jardim do Vasco da Gama. Eu tinha o meu casaco comprido de cor castanho claro e ele vestia uma parka, mais ou menos, de cor bege. Estava muito usada e velha. Mas eu nem ligava. Hoje, vendo bem as coisas, já devia ser do século passado ou do irmão dele. Mas fora isso, eu estava nas nuvens.
 
 
Falámos sobre as nossas prendas de Natal e como tinha sido a noite da consoada. Disse-me que a noite de Natal dele tinha sido muito triste. Pensava que eu deveria estar muito contente. De facto que estava. A minha mãe, irmãs, sobrinhas e cunhados estavam todos na minha casa. Fora uma noite muito linda e passada em família. Pena a minha mãe estar tão doente e alheia a tudo.
Contou-me que a mãe dele lhe tinha dado um pijama e outras bugigangas que não referenciou.
Eu disse que a minha mãe me tinha dado uma libra em ouro e que tinha dado a cada uma das filhas igual. Também contei que tinha dado dez contos a cada neta. Era já o habitual e, embora estivesse doente, mas num dos seus momentos lúcidos, pediu isso à minha irmã. Também tinha dado cinco contos a cada genro. Disse que tinha pena de não ser genro da minha mãe.
Foi um dia cheio de beijinhos e carícias. Quando chegou a hora da partida, foi muito triste. Vi nos olhos dele uma tristeza imensa e fiquei, também, muito triste. Já com a porta do comboio fachada, colocou a mão dele no vidro e eu coloquei a minha sobre a dele. Chorei...
 
No caminho pensei mesmo que ele me amava e que a minha filha estava enganada. Mas não se enganou, infelizmente. Ele estava a preparar o golpe de misericórdia que havia de dar uns meses a seguir. Andava a preparar o caminho para me levar à certa e para eu concordar com tudo sem pestanejar.
Nessa noite já não falámos, mas enviou-me a seguinte mensagem, via telemóvel:
 
 
21h56m59s
 
< Hoje iluminastes o meu dia. Bjs de boa noite e agradeço a tua prenda. >  
 

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