segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Quarto dia na Nazaré

Quinta, 13 de Janeiro de 2005
 
A fotografia que hoje posto é o " Solar dos Carvalhos ". Foi aqui, no segundo andar, que passei os meus dias, na Nazaré, com o Fernando Pedro.
Ele continua aí, pelo face, com outro nome. Mantem sempre o " Pedro". O apelido é que varia. Mas não vou dizer o apelido. Não quero que ele fuja. E não quero colocar mal quem mo disse. Os outros já toda a gente conhece: Pedrokas; Pedro Sintra, Pedro Lisboa e uns milhentos que não vale a pena mencionar.
 
Neste dia, também, acordámos cedo. Ele não conseguia estar na cama depois daquela hora. Como já era hábito, tomámos banho juntos e ele fez sempre as mesmas coisas. Já se tornara numa rotina e eu estava a detestar. Mas não dizia nada para não o magoar. O pequeno almoço foi, ligeiramente, diferente. Eu assim o quis para quebrar a rotina.
Fomos ao mesmo café onde íamos todos os dias e onde eu dava pela falta do meu dinheiro. Enquanto ele estava ao balcão, eu via o que tinha acontecido enquanto eu dormia.
Os óculos do Fernando Pedro tinham as hastes soltas e ele foi a uma ourivesaria, ao cimo da rua, que tinha óculos de sol na montra, para o Senhor lhos apertar. O Senhor foi simpático e apertou-lhe as hastes.
Quando começámos a descer a rua em direção ao mar, ele deteve-se, mais uma vez, em frente à sapataria a ver os sapatos que continuavam ali à sua espera. Mas ainda não os comprou.
 
Neste dia andámos na praia. Mesmo na areia da praia. Eu não queria ir porque a areia entrava para dentro dos meus sapatos e fazia-me impressão. Ensinou-me a andar na areia sem que a mesma entrasse para os sapatos. Foi giro e aprendi. Percorremos a praia toda de mãos dadas. Ouvíamos o marulhar das ondas que batiam, de mansinho, na areia e desmaiavam no areal num embelezamento que fazia inveja. As ondas desfaziam-se de prazer e ele comparou-as com a maneira como fazia amor comigo. Dizia-me ao ouvido: - Amor é assim que me acontece quando me entrego a ti quando fazemos amor.  Eu chamei-o de " convencido " e ele riu com gargalhadas francas e desprendidas de satisfação. Apertou-me junto a ele e beijou-me com uma avidez que me fez desejar que ele não parasse. É exímio naquilo que faz:- Seduzir uma mulher mais velha. Ele sabe o que faz e sabe que o faz bem, quando quer e até querer. Quando deixa de querer, deixa de  "saber fazer ".
De volta para o apartamento, viemos pelo calçadão. Um casal dava de comer às gaivotas. Pela segurança das gaivotas, via-se que já estavam habituadas àquele ritual. Ficámos um montão de tempo a ver e a apreciar o momento.
O Fernando Pedro tirou uma fotografia. Ele andava sempre com a digital na mão.
Depois enveredámos por umas ruelas estreitas e fomos comer a uma tasca chamada " Vicente ". Tinham caldeirada neste dia. Como era o último passado na Nazaré, reservámos a caldeirada para este dia. Era o dia do Fernando Pedro pagar. Pagava com o meu dinheiro como se eu nunca tivesse dado conta que ele mexia na minha carteira.
A caldeirada foi muito pobre. Tinha muita batata e pouco peixe. Foi um fiasco. Comentámos o sucedido, mas já não havia nada a fazer.
Neste restaurante, tirou-me umas fotos que estive a rever antes de começar a escrever o que tenho no meu diário.
Depois do almoço, andámos pela marginal a ver as lojas. Eu comprei algumas coisas e ele também.
Regressámos ao apartamento para deixar os sacos. Era sempre à tarde que ele gostava de fazer amor. Era uma tarde de velinhas e muita farra. Hoje sinto-me envergonhada de o recordar, mas não posso modificar o passado. Como disse atrás, isto tudo faz parte da história que construi com ele. Nunca serei capaz de a apagar. Mesmo que queime o meu diário, a história continua.
Tomámos banho e saímos para a rua para ir comprar o jantar ao super da Lena.
Ao passarmos pela sapataria, os sapatos ainda lá continuavam. O Fernando Pedro disse que tinha mesmo que os comprar. Eram giros. Castanhos claros com uma tira ao meio e com atacadores. Mais tarde, tirou-lhe a tira, mas eu conheci-os logo.
 Ele estava à espera que ele lhos comprasse, mas eu desviei-me e comecei a ver as malas para senhora. Não comprei nenhuma, mas também não lhe comprei, diretamente, os sapatos. Eu sabia que ele já lá tinha o dinheiro para eles. E era meu.
O jantar foi à luz das velas e o romantismo pairava no ar.
Ficámos a ver televisão até tarde e fomos para a cama para dormirmos a última noite, muito agarradinhos, desta vez, na Nazaré.

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