sábado, 2 de janeiro de 2016

Passeio no Campera

Quarta, 2 de Março de 2005

Uma imagem do Campera onde eu  e o Pedro íamos almoçar cada vez que ele me vinha visitar no remanso da minha casa.
Foram dias de felicidade, não o nego, mas dias em que a minha decadência se aproximava e eu dava passos largos a caminho do cadafalso como Maria Antoniette.
 Eu não conhecia nem nunca conheci o verdadeiro Fernando Pedro e, até acho, que nem a própria que o pariu, o conheceu verdadeiramente. Ele é um homem tão facetado que não consegue descobrir a sua verdadeira identidade. É o homem das mil vidas. Será que ele próprio alguma vez se descobriu? Creio que não. Fantasia até morrer.
Neste dia o encontro foi aqui na minha casa. Como sempre, eu estava na estação dos comboios à sua espera. Mais minuto menos minuto, o comboio chegava sempre. Nele vinham as mesmas pessoas de todos os dias. Já conhecia aqueles rotos de cor. Eram rostos cansados e triste depois de uma noite de trabalho. Desciam as escadas com pressa. Uma pressa de quem quer ir para a cama dormir, descansar e esquecer que mais uma noite tinha passado.
Eu esperava o Pedro no meu carro vermelho. Esperava-o com ansiedade, mas também com a esperança que um dia não aparecesse mais. Uma coisa eu conhecia do Fernando Pedro Cachaço Marques. Só sabia pedir prendas, almoços e férias em locais escolhidos por ele com bons aparthoteis e boas comodidades. Nunca viveu no luxo, mas desde que descobriu que marcar mulheres de bem financeiramente, carentes, viúvas e mal amadas, ele poderia desfrutar de esse bem essencial na sua vida. Ele julga que é "insubstituível". Mas não é. É apenas um desgraçado que se afirma à custa de outras pessoas que acreditam nas suas mentiras e fantasias.
As horas eram mais ou menos as mesmas de sempre. Vi-o descer as escadas com segurança. Os seus olhos de águia logo lubricaram o meu carro e começou a acenar com um sorriso franco nos lábios. Eu respondi ao aceno, mas o meu coração, não. Eu sabia que ia passar umas horas de prazer, mas que me sairiam bem caras. Acenei sem convicção e receosa.
Mas olhei o relógio para registar a hora da chegada. Eram 09h15m10s.
Ele chegou junto de mim com a mesma ternura de sempre e beijou-me com bravura e entusiasmo. Eram beijos que pareciam ser sinceros. Mas não eram e nunca foram. Apenas serviam para camuflar a sua estratégia. Respondi aos seus beijos e convidei-o a entrar.
Perguntou-me se estava com "fominha" e eu respondi que já tinha tomado o pequeno-almoço, se bem que soubesse a que "fominha" se referia. Perguntei se ele tinha tomado o dele ou se queria ir à pastelaria do Centro tomar um pequeno-almoço substancial. Começou a rir com aquele rir matreiro e que eu conhecia tão bem. Respondeu que já tinha tomado e que não era conveniente tomar outro. Iríamos almoçar mais tarde.
Na viagem não usou as mãos para explorar e não se mexeu do seu lugar. Estranhei, mas não fiz nenhuma referência. Afinal não era doida por ele. Apenas por umas horas de prazer. Também me servi dele e de que maneira.
Em casa tudo se repetia. O seu fetiche da beira da cama e o não aguentar a pedalada de uma mulher mais velha. Pensava ele que eu ficava satisfeita, mas muitos dias ficava, ingloriamente, triste. Por mim que estava a deitar o meu dinheiro à rua e que ele não merecia. Porém, ele pensava que eu tinha ido ao sétimo céu. Muitas vezes era no banho que ele colmatava essa falha. Nunca lho mencionei directamente, mas através do telemóvel, um dia, quando as coisas azedaram.
Eu sabia fingir bem para ele não se sentir frustrado, mas a minha desilusão era enorme.
Neste dia foi tudo igual e eu, só no banho, consegui atingir o meu orgasmo. Enfim, tudo escrevi no meu diário para não me esquecer de nada.
Quando fomos almoçar, fizemo-lo no Campera. Foi ele que escolheu. A escolha recaiu no "Pão com chouriço" no primeiro andar. Não foi uma boa opção, mas foi ele que escolheu.
Os pratos estavam com falhas, os copos rachados e os guardanapos todos amarrotados.
Ele chamou um empregado e fez referencia a isso. Os pratos foram trocados e os copos também, mas tudo foi parar à mesa do lado. O Fernando Pedro ficou muito chateado e disse que não gostava de ser ignorado. Queria pedir o livro de reclamações e eu não deixei. Já o tinha avisado que este restaurante não era grande coisa depois de ter mudado de direcção. Contudo, ele não gostava de ser uma mulher a decidir.
Depois de eu ter pago a conta, um prato de peixe e outro de carne, deambulámos pelas ruas das lojas. Aqui gostava disto, ali queria aquilo e eu perguntei se ele queria de prenda de anos roupa ou o que tinha escolhido no dia anterior. Respondeu que queria o que já tinha escolhido. Mas que não fazia mal eu comprar-lhe um mimozinho. Nem dei ouvidos e prendi-me numa montra de roupa de senhora e disse que não fazia mal se ele me comprasse uma lembrança.
Olhou-me com um olhar que nunca tinha visto nele e disse que eu só poderia estar a brincar. Respondi que não e que tinha o mesmo direito de escolher como ele.
Continuámos o nosso passeio e eu meti-lhe a mão no bolso. Com um arremesso, tirou-me a mão de lá e disse que alguém poderia conhecer-nos. Também frisou que a filha mais velha tinha feito uma casa dali. Não referenciou qual. Disse que não a queriam deixar ir embora, mas que ela fora para outro Centro fazer outra casa. Via-se que estava orgulhoso disso.
Com esta passeata toda chegou a hora de ir levá-lo ao comboio. Já não viemos à minha casa. Dali fomos directos à estação. Deixámos partir um comboio para estarmos mais tempo juntos. Depois despedimo-nos com abraços e beijinhos prometendo estarmos juntos muito em breve.
Neste dia não houve msn nem mensagem via telemóvel.

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